terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Comentário ao acórdão de 16 de Setembro de 2004, Proc. 00433/04.3BEPRT



I – Introdução

O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16 de Setembro de 2004[i] – que ora me proponho a comentar e que doravante designarei por «Acórdão» - o tribunal é chamado a pronunciar-se, no âmbito de recurso interposto pelo ora Recorrente, acerca de uma providência cautelar com vista a suspender a eficácia da deliberação do júri que realizou a classificação final dos interessados para um concurso de professor catedrático do Grupo/Subgrupo 2 – Educação para a Universidade de Aveiro, bem como solicitou a intimação para abstenção de nomeação do contrainteressado.

II – A questão em juízo

            O recorrente viu a sua pretensão ser negada no despacho liminar, indeferimento este que se baseou nas alíneas a) e b) do artigo 120.º CPTA, motivo pelo qual, inconformado, interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte. Alegou, o ora recorrente, que se estava perante um ato manifestamente ilegal, pois o contrainteressado era formado na área da psicologia clínica, não podendo ser admitido, e muito menos classificado em primeiro lugar, num concurso que tem como finalidade preencher uma vaga para professor catedrático na área da educação. A par deste argumento, arrazoa ainda o recorrente que a falta de fundamentação da pretensão anulatória da deliberação do júri não é manifesta e que a deliberação do júri e, por conseguinte, a designação do contrainteressado, atendendo ao seu currículo, lesa o interesse público.
            O que se visa no caso em apreço é o ato de nomeação, que é um ato administrativo, e, portanto, obstar a esta escolha, por parte do júri, do contrainteressado em detrimento do aqui recorrente, alicerçando-se na ilegalidade dos atos de admissão e de concurso. O recorrente apela ao critério exarado na al. a) do artigo 120.º do CPTA (anterior à revisão), considerando, o requerente, que o caso em apreço, por o ato ser manifestamente ilegal, é excecional de fumus boni iuris que o exonera de o preenchimento dos pressupostos da proporcionalidade e do periculum in mora.
            Prossegue o tribunal que a exceção invocada não é atendida por não ser manifestamente verosímil que a deliberação do júri será realmente anulada, por não parecer existir uma “. Além disso, a premissa invocada pelo recorrente – de o contrainteressado ter currículo na área da psicológica clínica não releva uma vez que o concurso não se encontrava vedado a professores de disciplinas análogas. Considera o tribunal que não é palpável a “carência de requisitos de admissão do contrainteressado candidato ao concurso seja um facto tão evidente que torne provável ou previsível a anulação da classificação final.”[ii]
            Conclui o tribunal que recorrendo aos critérios usuais deveria provar o periculum in mora e a proporcionalidade, apesar de ter sustentado, acerca deste último que o interesse público seria lesado, entendendo o tribunal que não resulta nenhum dano para o requerente, muito menos irreversíveis, pois se a deliberação for anulada e o autor for classificado em primeiro lugar a providência não terá efeito útil. Decide o tribunal, e citando, “Confrontando este dano com o prejuízo que pode advir durante a pendência do processo para o requerente e contrainteressado pelo facto de não exercerem as funções correspondentes àquela categoria, crê-se ser mais vantajosa a nomeação, pois dessa forma ao menos satisfaz-se o interesse público e o interesse do contrainteressado. Com a concessão da providência, não só não se satisfaz qualquer destes interesses, como não se vislumbra que interesse do recorrente ficaria provisoriamente satisfeito, pois, na sequência da providência, não segue a sua nomeação para o cargo.[iii]

III – Enquadramento teórico

            As providências cautelares são instrumentais da ação principal, baseando-se a sua razão de existência no facto de a ação demorar um período mais ou menos longo, pelo que é suscetível de acarretar consequências que, ao momento da decisão, terá um efeito inútil, perdendo, deste modo o efeito prático.[iv]
            O procedimento cautelar visa uma providência provisória destinada a durar enquanto não seja proferida decisão definitiva na ação principal proposta ou a propor, podendo ser preliminar ou incidente de acordo com o n. º1 do artigo 113º CPTA e que caduca no caso de a ação não ser proposta.[v]
            Para ser decretada uma providência cautelar têm que se encontrar preenchidos determinados pressupostos. Primeiramente, tem que se verificar o periculum in mora, quer isto dizer, que tem que haver um estado de perigo que pode expor o requerente a danos irreparáveis, ou seja, a providência deve servir para evitar um prejuízo grave que ameaça um direito subjetivo, contido no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA. Em segundo lugar, deve preencher-se o pressuposto do fumus boni juris, quer isto significar verosimilhança e, portanto, se parece que o autor tem razão é possível, é verosímil, que, de facto tenha contido no n.º 1 do artigo 120.º CPTA. O juiz deve ficar convencido, mas não totalmente uma vez que a providência se destina a vigorar temporariamente. Por fim, a proporcionalidade, quer isto dizer que deve existir uma ponderação de interesses e se resultar um prejuízo que exceda o dano que se evita tal não deve ser acolhida, contido no n.º 2 do artigo 120.º CPTA.[vi]
            No que concerne ao prazo, como referi supra, a providência pode ser requerida enquanto pode ser proposta a ação principal, se a mesma não fora proposta tempestivamente, caduca de acordo com a alínea a) do n.º1 do artigo 123º CPTA e, por essa razão, não é possível requerer a providência cautelar, não tendo, portanto, à primeira vista um prazo concreto.[vii]
            No que ao tipo de providências diz respeito, as mesmas podem ser conservatórias ou antecipatórias, querendo sito significar que, por vezes, que podem conservar ou manter um direito que o interessado entende estar em perigo ou antecipar, a título provisório o resultado favorável que se pretende com a ação principal, respetivamente.[viii] Estas providências visam, respetivamente, tutelar as situações jurídicas finais estáticas ou opositivas e as situações jurídicas instrumentais, dinâmicas ou pretensivas[ix].
Além desta classificação, as providências cautelares podem ainda ser típicas ou atípicas, que devem cumprir os requisitos supra elencados.[x]
            Por fim, cabe dizer que a legitimidade cabe a quem possui legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos de acordo com o n.º 1 do artigo 112º CPTA.

IV – Conclusão
            Conclui-se que andou bem o coletivo de juízes ao negar provimento ao recurso pelos fundamentos acima referenciados.
           



[i] Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16 de setembro de 2004, proferido no processo 00433/04.3BEPRT, consultado em: http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf//D414CB6D0F11827680256F40005B4155.
[ii] Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16 de setembro de 2004, proferido no processo 00433/04.3BEPRT, consultado em: http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf//D414CB6D0F11827680256F40005B4155.
[iii] Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16 de setembro de 2004, proferido no processo 00433/04.3BEPRT, consultado em: http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf//D414CB6D0F11827680256F40005B4155.
[iv]PAIS DE AMARAL, Jorge Augusto, Direito Processual Civil, 9.º edição, Almedina, 2010, pág. 24 e pp. 27-28; VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos, Justiça Administrativa, 11.ª edição, Almedina, 2011, pág. 301.
[v] PAIS DE AMARAL, Jorge Augusto, Direito Processual Civil, 9.º edição, Almedina, 2010 pág. 25; VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos, Justiça Administrativa, 11.ª edição, Almedina, 2011, pág. 301
[vi] PAIS DE AMARAL, Jorge Augusto, Direito Processual Civil, 9.º edição, Almedina, 2010, pp. 24-25.
[vii] ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 1ª edição, Almedina, 2010, pág.450
[viii] ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 1ª edição, Almedina, 2010, pp.445-446; PAIS DE AMARAL, Jorge Augusto, Direito Processual Civil, 9.º edição, Almedina, 2010, pág. 26.
[ix]ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 1ª edição, Almedina, 2010, pág.446.
[x]ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 1ª edição, Almedina, 2010, pág.44;

Sara Gato
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